Câncer de Trópico 2: expectativas
Série contando os últimos 22 dias do meu pai num hospital público de São Paulo.

Por volta das 6 da manhã. O corpo já sentia falta dos horários do retiro. E era só a primeira vez em cinco meses que eu quebrava a rotina – acordar às quatro, pular da cama, fazer a primeira sessão de práticas até às seis e trinta.
Talvez o corpo estivesse lidando é com a insônia da noite anterior. Na verdade, ela surgiu por questões práticas, como planejamento da viagem e, claro, gestão de narrativas, marketing.
Ninguém além de mim se importava com isso, mas eu ainda estava compondo um novo personagem na cabeça: o praticante budista que não “falhou”, não “abandonou” a disciplina do retiro, mas que precisou sair pra ajudar a família. Mais um percalço na jornada do herói.
O que meus parentes me perguntariam? Eu estaria diferente, mais calmo, mais humano? Afinal, esses meses de práticas funcionaram? Como eu lidaria com a morte do meu pai? As pessoas iriam querer saber “o que os budistas pensam” nessa hora. Seria puro escrutínio, defesa de tese, performance.
Continue a leitura com um teste grátis de 7 dias
Assine Texto Sobre Tela para continuar lendo esta publicação e obtenha 7 dias de acesso gratuito aos arquivos completos de publicações.
