De volta pro presente

Ler notícias sobre tecnologia virou uma espécie de alucinação futurista.

De volta pro presente
Versão meio IA de Scarlett Johansson.

Ler notícias sobre tecnologia virou uma espécie de alucinação. Parece que não vivemos no mesmo planeta dos tech bros da IA. Ali na esquina, tem gente sofrendo de leptospirose. Mas, nas conferências da Microsoft, OpenAI e Google, a impressão é que estamos num filme sci-fi, em velocidade 2x.

De uma semana pra cá, só se fala na nova versão do ChatGPT, que parece ter sido copiada do filme Her, de Spike Jonze – no qual um homem de meia-idade se apaixona por uma assistente virtual, que tem a voz de Scarlett Johasson.

O CEO da OpenAI, Sam Altman, chegou a convidá-la pra fazer as locuções do ChatGPT-4o. Ela recusou. Então, a empresa encontrou uma substituta com voz e performance bastante parecidas. A atriz não deixou barato: foi pra justiça e, agora, sua versão genérica foi eliminada do aplicativo.

Já o Google deve disponibilizar uma nova versão da sua busca, que, basicamente, revoluciona a ferramenta. Não precisaremos mais clicar em links azuis e visitar sites. A IA vai mastigar a digerir a informação ali mesmo.

Então, você abre seu navegador, faz uma busca e… tudo igual. Os mesmos links patrocinados e conteúdo baseado em gambiarras de SEO. Espere mais um pouco pelo futuro futurista.

Seguindo os sites de notícias de tecnologia, você quase tem múltiplos ataques cardíacos. São muitos brancos fazendo promessas assustadoras / entusiásticas em frente de slides. Tudo em ritmo de pré-lançamento. Prepare-se. Prepare-se agora.

É o que Sam Altman vem dizendo: mire no futuro. Pense grande. Não faça aplicativos pro poder computacional de agora. Ele vai ficar obsoleto em meses.

Então, você vai checar seu e-mail. O computador não aguenta e pede pra reiniciar. Tudo tão diferente e igual, ao mesmo tempo.

A imprensa parece uma viagem psicodélica. Um discurso contínuo de antecipação, imagens se formando e se dissipando rapidamente. Cripto, web3, metaverso, ChatGPT, Scarlett Johansson. Lança foguete, bate carro autoguiado, bane aplicativo chinês… Uou! Espere que vem aí mais uma conferência da Apple. Ah… É só mais uma versão mais fina do iPhone.

Imagine o que é estar na pele dessa gente, desses CEOs, desenvolvedores de aplicativos e pesquisadores. Hermeticamente isolados dos ritmos do planeta, dos problemas dos outros países. Quanta energia, quantos litros de kombucha, quanto tempo são necessários pra manter esse nível de alucinação?

Nem precisa ir longe. Moro a apenas 2 horas de carro do Vale do Silício. No entanto, preciso andar 10 minutos só pra conseguir sinal de celular. Sou vizinho do futuro. Mas não o vejo com frequência.

Enfim, pra quem esses tech bros estão criando seus produtos? Pra si mesmos?

Tem tanta gente com a cabeça no futuro, que precisaremos contratar alguém pra cuidar do presente.


Quando virei Scarlett Johansson

Por falar em Scarlett Johansson, há 4 anos, no podcast MonoEstéreo, publiquei a história de um sujeito que, após sonhos intranquilos, acordou transformado NELA. Sim, a própria, a inimitável atriz. Ouça aqui. Pior: é uma história parcialmente real.